Relatório de atividades do Candeeiro 2020-2023
Na caminhada do Núcleo Todos pelo Bem Comum tivemos que nos desviar do seu objetivo inicial – contribuir para a formação política da sociedade brasileira – para participar do enfrentamento de dois terremotos que afligiram o Brasil nos últimos cinco anos: a destruição do país empreendida pelo Presidente eleito em novembro de 2018, e o sofrimento imposto ao Brasil e ao mundo pela pandemia da Covid-19, aqui agravada pelas ações e omissões desse Presidente.
Nosso objetivo inicial nasceu da necessidade das nossas organizações sociais, igrejas e partidos políticos de esquerda retomarem o trabalho de educação política da população, trabalho esse que tinha sido deixado cada vez mais de lado a partir da posse, em 2003, de um Presidente da República que se propunha a enfrentar prioritariamente a escandalosa desigualdade social que caracteriza nosso país. E foi o abandono desse trabalho que permitiu o pesadelo da eleição, em 2018, do candidato mais despreparado e menos confiável para o cargo de Presidente da República.
Sua eleição foi possível exatamente porque encontrou o terreno livre para conseguir captar os votos da parcela menos informada da população, com o uso de uma tecnologia de direcionamento maciço de mensagens mentirosas pela internet, já experimentada com sucesso em outros lugares do mundo – como no Brexit e na eleição de Trump nos Estados Unidos.
Mas seu governo mostrou, de maneira clara e progressiva, sua intenção de destruir sistematicamente todos os avanços civilizatórios conquistados a partir do fim do regime militar instalado em 1964 no Brasil. E quando a pandemia da Covid-19 chegou ao Brasil, em 2020, sua personalidade doentia como que o associou a essa doença, para torná-la ainda mais mortífera, levando a que o número de vítimas ultrapassasse 700.000 – um dos números mais elevados na estatística internacional da pandemia, comparativamente à população de cada país.
Quando chegamos a 100.000 mortes, nosso Núcleo de Reflexão e Ação Política “Todos pelo Bem Comum” se viu compelido, como todas as organizações sociais brasileiras minimamente conscientes politicamente, a participar de maneira cada vez mais intensa – cada uma a seu modo e com os recursos de que dispunha – do esforço feito para afastar o mais rapidamente possível esse Presidente tão daninho para o país.
E fomos nos aliando a outras organizações empenhadas nesse mesmo esforço, além da parceria que já tínhamos com a Ação Educativa: o Centro de Estudos Bíblicos (CEBI) e seus núcleos em todo o país, a Associação de Familiares de Vítimas da Covid – AVICO, que se espalhara Brasil afora, as Comissões Justiça e Paz, a Associação de Juízes pela Democracia, a FIBRA – Frente Internacional de Brasileiros, com coletivos em vários países do mundo. Ao mesmo tempo, fizemos parcerias com mais de 70 entidades da sociedade civil.
Nesse quadro, nos empenhamos primeiro diretamente na luta pelo impeachment do Presidente, reforçando as mobilizações populares pelo impeachment-já e lançando petições pela internet, dirigidas ao Presidente da Câmara dos Deputados. A que iniciamos em 18/12/2020 (https://www.change.org/p/agora-200-000-mortos-estamos-ainda-mais-consternados-e-indignados) recebeu 1.355 assinaturas. Não imaginávamos quantas mais mortes – calcula-se que um terço delas evitáveis – ainda ocorreriam.
Mas este esforço era anulado pela barreira que se construíra, com uma maioria de parlamentares apoiadores do Presidente, eleitos na sua onda eleitoral – entre os quais muitos oportunistas dispostos a trocar seus votos por vantagens de diferentes tipos. Chegou-se a apresentar ao Congresso, que teria que tomar essa decisão, mais de 150 pedidos com esse objetivo – o primeiro três meses depois da eleição, pelos crimes já cometidos.
Organizamos então, em 2021, uma série de quatro lives sobre o que se passava, visando mobilizar mais gente: “Urgente: AVICO X Bolsonaro no STF” em 19/05, “Luta e Luto” (duas lives, em 05/08 e em 19/08), e “Como tirar Bolsonaro em 2021”, em 21/10. Já na perspectiva da eleição de um novo Congresso em 2017, fizemos em 2022 uma série de cinco lives de formação política sobre “O poder do Legislativo” e a importância do nosso voto para deputado e senador (em 08/09, 14/09, 21/09 e 28/09). E entre o primeiro e o segundo turno da eleição de 2022, duas lives com o titulo “Democracia X Impunidade e Banalização do Inaceitável” (em 19/10 e 26/10).
Essas lives, mantidas na plataforma ocandeeiro.org e em nosso canal no youtube para serem posteriormente visualizadas pelos interessados, estão acessíveis pelo link Candeeiro – YouTube
Passamos ao mesmo tempo a apelar a outras instâncias e instituições com poder para afastar o Presidente, como o Ministério Público, então passível de ser acusado de prevaricação, com uma petição “Ô Ministério Público, Denuncia Já!”, que foi assinada, via plataforma change.org, por 1.060 pessoas, e no nosso próprio site, por 420 pessoas e 41 entidades. Em seguida uma “Carta Aberta ao Conselho Superior do Ministério Público Federal”, assinada por 350 pessoas físicas e entidades. E apelamos ao Senado, com poder para afastar o Procurador Geral da República por sua prevaricação, com uma “Carta Aberta aos Senadores e Senadoras pelo Impeachment de Aras Já”, assinada por 8.386 pessoas físicas e entidades.
Já depois do primeiro turno, em que já se desenhou a provável derrota do inominável Presidente, lançamos em 10/10 uma “Carta Aberta à gente brasileira por uma Frente de Resistência e Reconstrução Nacional”, que enumerava 15 possíveis tipos de ação para essa reconstrução. Os signatários dessa Carta – 445 pessoas físicas e 41 entidades – eram encabeçados por quatro pessoas e organizações brasileiras que receberam o Prêmio conhecido como Nobel Alternativo (Right Livelihood Award).
Ao longo desse esforço, fomos constatando que enfrentávamos uma dificuldade suplementar – talvez também devida ao abandono do trabalho de formação política: a tendência generalizada das pessoas a se “acostumarem” com os absurdos que ocorriam, “naturalizando” o inaceitável, o que diminuía sua disposição para agir. E foi nessa perspectiva que as duas últimas lives que organizamos, entre o primeiro e o segundo turno das eleições de 2022, em torno do ”Manifesto pelo fim da impunidade do Presidente da República, por um Brasil democrático, de Justiça, Solidariedade e Paz”, teve o título “Democracia X impunidade e banalização do inaceitável”.
Muitas dessas atividades estão registradas em nossa plataforma, e podem ser visualizadas por este site, clicando aqui e pelos canais Instagram, Facebook, YouTube e LinkTree.
Apesar, no entanto, de todo o esforço feito por uma verdadeira Frente Ampla que se formou no Brasil, do qual ocandeeiro.org participou dentro de suas possibilidades, não se conseguiu que antes das eleições fosse superada a dramática situação que estávamos vivendo, e que já dava sinais de abrir espaço para enfrentamentos violentos, com o país dividido em dois: uma metade constituída pelos apoiadores do Presidente, nos quais tinha sido alimentado um sentimento de ódio pela outra metade, dos que desejavam seu afastamento do poder.
Essa ameaça era ainda mais grave porque o Presidente indesejado tinha facilitado a entrada de armamentos no país, legal e ilegalmente, com o que chegou a triplicar, em seu mandato, o número de armas em mãos de civis. E tinha estimulado a criação de “clubes de tiro”, para treinamento e guarda de estoques de armas e munições – ao largo do território nacional, mas especialmente nas regiões onde havia maiores disputas.
O afastamento que buscávamos só foi conseguido, finalmente, com as eleições de outubro de 2022 e a posse do novo Presidente em janeiro de 2023, apesar de todas as ameaças que foram feitas para o impedir. Houve inclusive uma tentativa desesperada de golpe de estado oito dias depois dessa posse, com a invasão e vandalização dos edifícios dos Três Poderes em Brasília, usando como carne de canhão milhares de apoiadores mais fanáticos do derrotado nas urnas.
Assim é que, ainda que possamos ser surpreendidos por novas tentativas de impor sua volta ao poder, nos vemos na possibilidade, enquanto organizações apoiadas na plataforma digital ocandeeiro.org, de voltar ao objetivo com que foi criada: o de “contribuir para o desenvolvimento da consciência política democrática da sociedade brasileira”.